Envejecimiento · 17 Março 2019

Porque é que temos tantos preconceitos sobre a velhice?

Sobre a velhice e pessoas com mais de 65 anos, como sabemos, há muitos preconceitos. Os preconceitos são, como suspeitamos, um parecer prévio - um juízo prévio a um conhecimento profundo da realidade - geralmente desfavoráveis. De uma forma muito sintética, poderíamos dizer que todo o preconceito é uma atitude geralmente negativa em relação a certas pessoas, causada pelo facto de pertencerem a determinadas categorias sociais e de não se basear nas suas características ou acções individuais.

Por outras palavras, julgamos a pessoa com base na ideia do grupo a que acreditamos que pertence. No momento em que fazemos isso, privamos a pessoa de ser valorizada por si mesma. Em outras palavras, os preconceitos que temos com outras pessoas são consequência de uma percepção estereotipada da realidade na qual não valorizamos as características do indivíduo (João, o meu vizinho do quinto), mas as do grupo (aquele velho do quinto) e, claro, aquelas que acreditamos que o grupo apresenta. Surgiria de um processo de diferenciação em que nos diferenciamos dos outros grupos (os jovens versus os idosos, por exemplo), que também caracterizamos de certa forma. Neste processo, assumimos automaticamente que todos nesse grupo apresentarão essas características. Mesmo que não seja necessariamente verdade, mesmo que não saibamos ao certo, tendemos a assumir que os indivíduos desse grupo apresentam um conjunto de características simplesmente porque fazem parte de um grupo. Se os idosos são mal-humorados e o João é velho, o João é automaticamente um resmungão. Dissemos que os preconceitos seriam a consequência lógica de uma percepção estereotipada, por isso devemos aprofundar o que é um estereótipo e como ele difere do preconceito.

Por estereótipo entendemos o conjunto de crenças sociais que estão associadas a uma categoria grupal, que provocam preconceitos e os justificam. Por outras palavras, estão intimamente relacionados. Os estereótipos justificam (psicológica e individualmente) os nossos preconceitos. Estão baseadas num processo de percepção (isto é, de como recebemos estímulos do exterior) e na representação que fazemos das outras pessoas e da realidade que nos rodeia.  É importante lembrar que a nossa percepção é subjetiva e não sem erros. Na percepção, segundo a qual só percebemos uma pequena parte da realidade que nos rodeia, outros processos também intervêm como a projecção (quando atribuímos as nossas próprias características a outra pessoa) ou a inferência (quando tiramos conclusões de um facto que talvez não tenha maior transcendência). Ajuda-nos a simplificar a realidade, a torná-la mais compreensível no meio de tanta informação como a que recebemos, mesmo que seja imprecisa e nos leve a conclusões erradas. Mais uma vez - pobre João, que não deixamos em paz - prestaremos mais atenção ao dia em que o João se zanga -embora justificado- para avaliar o seu caráter. Ou assumiremos que a ausência de um sorriso, por exemplo, é uma indicação do seu mau humor. 

Os estereótipos e preconceitos funcionam de forma bastante rígida e dão continuidade não só a certas relações de poder na sociedade, mas também às formas de se relacionarem uns com os outros na sociedade. Eles afetam a nossa participação social, a nossa forma de interagir com outras pessoas. Limita-nos. Estereótipos e preconceitos afectam os outros, mas também a nós. Por exemplo, vai privar-nos de conhecer o João, que por acaso é um grande tipo e campeão no jogo de mahjong. 

Por vezes, estes estereótipos contribuem para a criação de antagonismos que se assumem como reais, como quando a juventude e a velhice se colocam como inimigos naturais, em constante competição. Nesta abordagem, seria assumido que tudo o que caracteriza a velhice é negativo e deve ser evitado (ou escondido), enquanto a juventude seria um bom para manter. Levando-o ao extremo de fácil compreensão, esta abordagem explicaria a importância de certas cirurgias estéticas mesmo em risco para a saúde. Mas também a outras questões que negam a participação da velhice na sociedade. Para além dos exemplos ou das consequências extremas, esta simplificação da realidade levar-nos-ia a assumir que certas categorias variáveis (como a idade) têm efeitos sobre os próprios indivíduos que as experimentam.

De acordo com este ponto de vista, mudaríamos à medida que a nossa categoria muda. O que procuro aqui é reflectir sobre a falta de significado destes estereótipos e preconceitos que se aplicam ao grupo. Algumas categorias não mudam, ou o fazem com dificuldade, mas é precisamente a idade que, esperemos, muda. Se analisarmos estereótipos (nem mesmo no seu sentido negativo, mas como crenças que assumimos sobre os outros com base na sua pertença a um grupo) em relação a nós mesmos, veremos a falta de significado que eles implicam. Imagina: se assumirmos que todas as senhoras mais velhas são boas cozinheiras, o meu guisado de almôndegas será tão bom quanto o da minha avó quando eu fizer 65 anos? Bem, eu deveria assumir que provavelmente não (aqui eu tenho que dizer que minha avó Pepa era uma grande cozinheira. O melhor arroz doce do mundo). Quando aplicamos essas crenças a nós mesmos vemos o absurdo, por que aplicá-las aos outros parece lógico? A resposta nos levaria a pensar no viés com que interpretamos a realidade que nos rodeia e que nos torna tão difícil pôr fim à ilogicidade dos preconceitos. O problema de acabar com estereótipos e preconceitos é que eles fazem-nos focar apenas naquelas ações que são consistentes com a nossa ideia anterior, enquanto nós prestamos menos atenção (ou nenhuma) àquelas informações que não dão validade ao nosso estereótipo, que não o validam.

Mais ou menos conscientemente, chegamos a rejeitá-lo. E assim esquecemos o sorriso de João, o vizinho do quinto (espero que este edifício tenha um elevador, por sinal). Nós até usamos explicações como "mas essa é a exceção que confirma a regra". Ou dizemos barbaridades, por vezes não intencionalmente, tais como "os do teu grupo são assim, mas tu não és, tu és diferente". Tendemos a reforçar a diferenciação e a olhar para os casos que reforçam as nossas ideias anteriores. Acontece a todos nós e acontece-nos a toda as horas. O importante é ter consciência de que isto acontece para compreender e para o impedir. 

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